John Lindstron um repórter inglês de 58 anos, correspondente do jornal London Station, é conhecido como “desmistificador de mitos políticos”. Lindstron já esteve em mais de 40 países fazendo reportagens, relatando como tais locais eram descritos pela mídia internacional e como eles eram “de verdade” segundo sua ótica.
John Lindstron em viagem ao Afeganistão em 2005.
O correspondente inglês já esteve em locais de difícil – senão impossível – acessos, como na Coréia do Norte, no Zaire, e no Paquistão a fim de mostrar a “realidade real” destes locais para o mundo. O próximo destino do repórter é, dessa vez, a ilha dos irmãos Castro: Cuba. E a missão, simples num primeiro momento, é a de tirar a limpo se a ilha libertada por Che é realmente como a vimos ou não. Como posto, a missão parece simples, mas não é. Sabendo da fama de Lindstron, os governos ingleses, cubanos e, acreditem, norte americanos tentaram inviabilizar a visita do jornalista à ilha. Contudo o argumento da London Station desarmou os três governos. “Se a realidade mostrada por cada governo for fiel ao que John encontrar, não haverá problema algum em ele ratificar tais informações” disse Paul Winchester editor do periódico britânico.
The London Station. Periódico existe desde 1908 quando ainda se chamava London Journal.
Lindstron chegou à ilha de Cuba vindo de voo comercial diretamente de Londres sem grandes problemas “fiz uma viagem tranquila, melhor de que quando fui a muitos países da Ásia” comentou. Chegando a alfandega caribenha John foi encaminhado a uma espécie de sala de vistoria “Me perguntaram coisas triviais, mesmo eu sendo repórter. Nem parecia que estava em território comunista”. Antes de sair do aeroporto o repórter foi abordado por Carlos Bocca, que se apresentou como funcionário e “guia” enviado pelo governo cubano. Lindstron aceitou a guia de Bocca, por curiosidade, em um primeiro momento.
Como era de se suspeitar Bocca levou John a pontos turísticos da ilha, hospedando-o, inclusive, em sofisticado hotel patrocinado pelo próprio governo. A impressão do “turista” repórter foram as melhores possíveis “Posso dizer que Cuba está totalmente preparada para receber turistas de todo o mundo”. John também pode ver que estrategicamente todos os pontos turísticos de Cuba (praias, resorts, bangalôs paradisíacos, montanhas, trilhas...) estavam distantes dos pontos mais pobres da cidade “pareciam, às vezes, que as favelas haviam até sido trocadas de lugar”. Tal conclusão não surpreendeu Lindstron “em outros países caribenhos os governos usam dos mesmos artifícios”.
Cuba histórica é ponto inquestionável - e belo - para turistas
A expedição começaria a ficar mais séria quando John disse a Bocca que não precisaria mais de seus serviços de guia e que seguiria outros rumos a partir de então. O correspondente se surpreendeu quando não ouviu qualquer represália por parte do emissário latino “não houve absolutamente nenhuma relutância do militar. Me surpreendi. Havia realmente muita confiança por parte do governo”. A partir de então o repórter passou a percorrer livremente as ruas de Havana. Percebeu um povo tranquilo e sorridente, embaralhado a um transito barulhento e caótico “igualzinho a Bangcoc”. Sua pele branca e olhos claros o denunciavam como estrangeiro e nem se quisesse Lindstron poderia disfarçar. Nas ruas da capital cubana não havia surpresa e nem descontentamento com a presença de um estrangeiro no local “quando a gente pensa em países comunistas logo imagina-se desconfiança, desconforto... Nada disso aconteceu em Islamabad, Pequim ou aqui”.
John misturou-se a população. Em Havana homens de terno e gravata misturavam-se a outros vestidos de forma mais humilde. Havia bancas com cd’s e dvd’s piratas “que tinham de Beatles a Lady Gaga” cujos vendedores transitavam livremente, junto tinham bancas de comidas regionais que faziam às vezes do fast food capitalista. O repórter se impressionou com a tranquilidade da população em responder à suas perguntas “ninguém saiu correndo, me ameaçou, nem nada. Foi tudo bem tranquilo”.
Os camelôs afirmaram ao correspondente que tal pratica era ilegal, mas que há alguns anos que a polícia fazia vista grossa, deixando-os trabalhar tranquilamente. Assim como os camelôs, os donos de banquinha de comida, e as lotações (em péssimos estados) que mostravam que o trabalho informal era característica marcante de Cuba. John aproximou de um grupo de jovens que estavam numa praça nos arredores da capital. Puxou conversa, perguntou sobre a seleção de beisebol (esporte número um no gosto dos cubanos), falou sobre mulheres, carros...
Populares cubanos reunidos em cafés. Hábito quase centenário de fumar um charruto ao meio-dia
Não demorou para que a conversa chegasse à política. Quando preguntados sobre o governo os homens não hesitaram em comentar seja falando bem ou mal. Mais uma vez John se surpreendeu com a tranquilidade com que todos falavam “não havia policiais vigiando, câmeras escondidas e, principalmente, preocupação com as consequências. Por alguns minutos senti-me em um país capitalista qualquer”. As maiores reclamações eram com a desigualdade social e com o embargo americano. Mesmo assim os Estados Unidos não eram tratados como inimigos, longe disso até. Havia muita segurança e conhecimento na fala dos cubanos o que mostrava que o sistema educacional da ilha era de qualidade e não alienava politicamente seus moradores. Todos entendiam perfeitamente do porque de algumas privações e não se incomodavam com isso. A inquietação era com a influência norte americana que impedia que outros países pudessem estabelecer parcerias com Cuba. O desespero em fugir da ilha rumo a Miami também não transpareceu na conversa. Todos relataram que os fugitivos poderiam, se quisessem, ter uma vida humilde, contudo digna, no país e o relato de Estebán Gutierrez foi o que mais surpreendeu o repórter pela veemência “vejo muito irmãos entrando em embarcações furadas, com fome, sede, frio, para ir para a América limpar privadas por dois ou três pesos. Sendo que aqui, se quisesse, conseguiria isso trabalhando em dois turnos. Esse papo de melhor vida é coisa de ambicioso que acha que irá virar Glória Stefan”.
Embarcações citadas por Gutierrez. Sem condições mínimas de segurança
Os elogios ao governo foram proporcionais às críticas. Educação e a saúde estavam sempre em primeiro lugar. Lindstron se surpreendeu com os dentes, impecavelmente brancos e saudáveis, dos moradores. O esporte, antes bandeira do país, agora é tratado com preocupação. Pela primeira vez John percebeu algum discurso mais ufanista “antigamente nossos atletas lutavam por um ideal. Hoje só querem aparecer para abandonar a ilha e se encherem de dinheiro sujo”. Sobre Fidel Castro só elogios “é o maior!”. Che Guevara, para surpresa de John, é tratado sem grande empolgação. Apoiado pelos elogios da população o correspondente visitou duas escolas do subúrbio de Havana “extremamente limpas, arejadas, recheadas de figuras, com todos os alunos uniformizados e comportados. Impecável realmente!” Nos hospitais limpeza, organização e pequenas filas “coisa de país da Europa”. Lindstron concluiu que Cuba era um país com desigualdade social “como Brasil, México ou Chile”, com problemas estruturais “como qualquer outro país emergente”, com corrupção e dificuldades típicos de países em desenvolvimento. “Contudo definitivamente Cuba não é um país de miseráveis famintos e sem voz. Muito longe disso. Para as limitações econômicas vigentes por causa do embargo econômico até que o país se vira bem, tendo como pilares a educação, saúde e esporte. Todos podem opinar, desde em que esferas menores e é possível viver livremente sem imposições. Cuba é um país pobre sim, mas como qualquer outro. Por fim digo, sem medo, que os cubanos são felizes”. O mito de que Cuba é um país terrível para se viver foi quebrado por John Lindstron o derrubador de mitos políticos.
Antes de ir embora o repórter tentou ir a Guantánamo, prisão e base militar norte americana na ilha. Foi impedido. “Encontrei restrições infinitamente maiores do país que se diz livre do que com o suposto país fechado e intransigente”.
Já na Flórida Lindstron entrevistou Vicente Laisla poeta cubano residente nos Estados Unidos a mais de vinte anos e o perguntou sobre o que ele achava da imagem que os americanos vendem de Cuba: “Infelizmente nossa ilha é pobre. Nosso governante é teimoso o que impede de acabarmos com esta idiotice de comunismo. Somos comunistas, e pobres. De que vale isso? Vim para cá e consegui coisas que definitivamente não conseguiria em Havana. Sou rico e feliz. Mais talvez eu poderia ser rico e com certeza eu seria mais feliz se fosse em minha terra natal. Cuba não é o fim do mundo, mas poderia ser o começo de um”.
Já Pablo Rusna escritor residente em Porto Audaz próximo a Havana optou por outra resposta à mesma pergunta: “Sabe, os gringos pensam que só eles podem ser felizes. E que só podemos ser felizes ao modo deles. Ledo engano. Cuba é a mostra que é possível ser feliz sendo você mesmo e isso os mata”.
John Lindstorn
The London Station
Essa estória/reportagem não existiu, mas bem que poderia. Cuba é uma falsa ilha. Mas será que é falsa porque é feliz ou é feliz porque é falsa? Pense nisso caro leitor, não acredite em tudo que te falam. Ou seja, não acreditem em mim, mas também não acreditem nos Estados Unidos da América.